domingo, 9 de maio de 2010

Sobre códices e e-readers


Muito bom o cartoon acima, do Reinaldo, aquele mesmo do grupo Casseta& Planeta, que estreia hoje seção no jornal O Globo, com o título “A arte de zoar”.

Deixemos de lado o fato de que o autógrafo, no caso, é do Steve Jobs. Imaginaram o Guttemberg autografando livros impressos?
Dá para conceber um sebo de ebooks? No bairro de Akihabara, em Tóquio, há alguns anos, frequentei lojas e bancas especializadas em vender computadores e periféricos usados aos montes. Daqui a pouco, vão oferecer também, com certeza e-readers, se já não o fazem,. O suporte dos e-books, quando usado, está mais para traquitana de ferro- velho ou lixo antiecológico do que para artigo de sebo.



E já pensou numa noite de autógrafos ou numa dedicatória carinhosa para a namorada, quando se trata de um gadget desses?

Isso desvela, ao meu ver, algo que nunca vai se perder quando se trata do bom e velho códice impresso, o livro de papel tal qual o conhecemos: o quanto ele tem de tátil, de sensível, por oferecer-se a todos os sentidos (tem cheiro, cor, peso próprio), e de afetivo, pois guarda marcas, rugas do tempo, pode deixar entrever histórias de manuseio, acumular dedicatórias, que são marcas físicas de vidas e desejos..

Por isso, acredito, sinceramente, que as duas formas de veiculação da escrita vão continuar a coexistir durante muito tempo. Daqui a pouco não dará mais para a gente imaginar enciclopédias e atlas, por exemplo, em papel. Mas uma boa e velha história de detetive para ler na praia, num momento de preguiça, continuará se casando bem com um paperback – ainda que haja versões mais sofisticadas, interativas, para os iPads da vida.

Imagino que, daqui a algum tempo, a maioria dos livros seja lida em e-readers cada vez mais baratos e práticos. Mas que, nas outras franjas de um vasto espectro, continuaremos a ter edições para colecionadores, livros que explorem justamente o que o papel tem a oferecer com exclusividade aos sentidos, exemplares impressos com o fito de serem autografados em momentos especiais, bem como edições baratas – de bolso ou não – destinadas a um consumo rápido.

Por isso, confesso, não vejo a hora de comprar meu primeiro e-reader, que certamente vai facilitar muitas leituras. Mas que não vai subsituir, com certeza, aqueles livros comprados de última hora no aeroporto, os garimpos nos sebos de Brasília e São Paulo, a emoção de reler a dedicatória de um professor morto num ensaio importante para minha formação intelectual, ou de folhear a edição em fac-símile de um Livro de Horas medieval, recuperando um pouco o que seriam os movimentos de um leitor daquela época... Ou a de reencontrar nas estantes o primeiro livro comprado para mim por meu pai, ou o Voltaire que dei de presente para a namorada e que voltou para minha biblioteca quando me casei...

2 comentários: